Alcains Trail Camp

A convite do grande mister Didier Valente, juntei-me neste fim-de-semana a mais de uma vintena de adeptos da corrida nos trilhos para um estágio em duas etapas na zona da Serra da Estrela e da Serra da Gardunha. O plano era fazer 50 km com 3500m de D+ no sábado, na Estrela, e outros 30 km com 1500m de D+ para descomprimir na Gardunha, no domingo. Plano demasiado ambicioso para alguém como eu que não tem treinado nada de jeito há umas boas semanas, ponto assente. Decidi embarcar na aventura e deixar que fosse o diálogo entre o trilho e o meu corpo a determinar até onde fazia sentido ir.

Depois da pernoita no pavilhão da Escola Secundária de Alcains (finalmente estreei-me em solo duro, adeus vida de princesa dos trilhos), a alvorada foi às 5h porque ainda nos esperava mais de uma hora de estrada até ao ponto de saída, no Alvoco. Conseguimos começar ainda pela fresquinha e descer até à cota dos 400 m de altitude para “ir buscar o desnível”.

A partir daí não havia muito que saber, era subir até à torre. O petisco incluiu o quilómetro vertical do Armando Teixeira, que se fez muito bem, a ritmo constante e à bastonada. Na torre, a vista estava meio encoberta e o vento fresquinho causava demasiado desconforto às atletas magricelas e ensopadas em suor (alerta para a hipotermia no UTAT) mas deu para comer qualquer coisa e seguir caminho até a uma muito feliz desorientação, que nos levou até à Lagoa do Covão das Quelhas. Impunha-se um mergulho e que bem que ele soube.

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Era tempo de fazer a descida da garganta de Loriga, sobre a qual só tinha ouvido maravilhas e horrores. A paisagem é deslumbrante, esta fotografia não lhe faz justiça.

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Faça-se a ressalva que foi tirada à pressa porque os meus companheiros de caminho iam cheios de medo dos cães (depois de sobrevivermos às vacas e às cabras… Perigosíssimas) e fomos saindo de fininho daquela zona. O piso daquela região, como é sabido, é pedrícola e irregular. Apesar dos cuidados, torci um pé por volta do quilómetro 20. Ligaram-me o tornozelo e consegui seguir caminho sem grandes dores mas ficou decidido que teria de encurtar a jornada. Chegando a Loriga, afinfei uma bela bifana e fui fazer a digestão para a maravilhosa piscina fluvial, com água cristalina da nascente e uma vista esmagadora para o maciço de granito da garganta. O regresso ao Alvoco foi sossegado, pela estrada, para não estragar mais o tornozelo.  É claro que tive de dar mais um mergulho na piscina do Alvoco porque ainda não tinha nadado o suficiente naquele dia.

Domingo. O tornozelo ligado parecia querer colaborar, toca de seguir até Castelo Novo para atacar a Serra da Gardunha. Subimos a encosta sul por estradão, eu sempre no meu ritmo sereno a tentar não perder muito os outros de vista, e fomos percorrendo a crista dos montes no meio de uma paisagem menos dramática do que a da Estrela mas nem por isso menos bonita (aqui não tenho a desculpa dos cães, é só falta de jeito para a fotografia).

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As marcações de caminhada eram menos fiáveis do que no percurso do dia anterior por isso foi com muita satisfação que acompanhámos o Luís Matos Ferreira, com a sua preciosa experiência. Fomos contornando a encosta oeste e descendo junto a um ribeiro onde, quer dizer,

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Não havia como não mergulhar, não é? A banhoca foi preciosa porque o calor já apertava e os quilómetros dos dois dias iam fazendo mossa nas pernas. Depois, eu nem queria mas quando o nosso grande timoneiro ad hoc decidiu que devíamos parar em Louriçal do Campo para beber umas minis e comer uns tremoços, não havia como recusar. Registo com agrado mais esta estreia nos trilhos. De alguma maneira, a cabeça zonza foi o impulso que faltava para atacar a última subida sempre a trote debaixo da torreira do sol. Já só queríamos chegar e, claro, atirarmo-nos para a piscina fluvial de Castelo Novo. Toda esta água e mais os pirolitos que andei a engolir na natação, enquanto não pude correr, vão bem gravados na memória quando estiver a tomar pó às colheradas na paisagem lunar do Atlas.

Bom, a brincar, a brincar, foram 70 km de treino com mais de 4000 D+ (ainda não descarreguei os tracks para saber os números ao certo). O tornozelo está sensível mas não inchou nem dói. Os isquiotibiais portaram-se como deve ser. O empeno de hoje é suave. O ritmo é tudo. A continuação dos treinos nas próximas semanas será muito condicionada e caótica até à prova, porque entretanto a minha vida pessoal levou uma grande volta. Espero conseguir completar o UTAT, apesar de tudo. É um desejo e um projecto que sempre assumi com seriedade. Logo se vê o que é possível fazer.

6 thoughts on “Alcains Trail Camp

  1. Parece-me ter o grau misto de ‘cena épica’, ‘maluqueira total’ e ‘petisco e banhoca da boa com fartura’, pelo menos no meu prisma. A ver se para o ano faço uma coisa do género ou então pinto o cabelo de verde, coisa que cobre as duas primeiras premissas, mas tem a grave falha na terceira questão 😉

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